Sítio dos Sonhos | Milan Kundera, Tamina e os avestruzes
À página 117 de O Livro do Riso e do Esquecimento:
Antes de chegar ao destino, parou o carro para levá-la visitar um jardim zoológico instalado no parque de um belo castelo de província. Eles passearam entre os macacos e os papagaios num cenário de torres góticas. Passaram por um lobo, um castor, um macaco e um tigre e chegaram a um grande descampado circundado por uma cerca de arame atrás da qual havia alguns avestruzes. Eram seis. Ao perceberem Tamina e Hugo, correram para eles. Agora formavam um pequeno grupo que se comprimia contra a cerca, espichavam seus longos pescoços, olhavam para eles e abriam os bicos compridos e achatados. Abriam-nos e fechavam-nos numa velocidade incrível, febrilmente, como se quisessem falar cada um mais alto que o outro. Só que esses bicos eram desesperadamente mudos e deles não saía o menor som. Os avestruzes eram como mensageiros que tivessem aprendido de cor uma mensagem importante, mas o inimigo lhes cortara as cordas vocais no caminho, e eles, tendo chegado ao destino, não podiam fazer nada a não ser mexer suas bocas afônicas.
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Nessa noite, Tamina sonhou com os avestruzes. Eles se encostavam na cerca e falavam todos ao mesmo tempo. Ela estava apavorada. Não podia se mexer, observava seus bicos mudos, como que hipnotizada. Conservava os lábios convulsivamente fechados. Porque tinha um anel de ouro na boca e temia por esse anel.
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