[Glosa do trecho destacado em “Sou trivial?” – tropo: “O sujeito se choca com a possibilidade de ser como todos” – de No Caminho de Swann, de Marcel Proust]
O personagem chega ao sentimento de ser pouca coisa após considerar o que seria a sua falta de talento para a literatura, sugerida pelo fato de que, ao procurar um tema para sua narrativa, algo consistente e de peso, não encontra nada dentro de si. O não-dito vale por uma definição de literatura: se fosse realmente escritor, não existiria como os outros homens, não envelheceria e morreria como eles, teria outra maneira de existência, seu envelhecimento e sua morte — podemos supor — seriam, no fim das contas, insubstanciais. A vida comum é aqui um defeito; a escapatória é a arte, mas ela não concede suas graças a todos, e nosso protagonista sente que ela não as concedeu a si… Interessante também o final do parágrafo: elogios não lhe faziam qualquer bem, como a boa fama de um canalha não poderiam lhe livrar da culpa. Isso indica que a aprovação dos outros não pode dar o veredicto “és, sim, escritor — e, pois, único” – o júri é interno.
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